Leia abaixo o texto escrito pelo jornalista António de Sousa Pereira para a Absolute Motors sobre este automóvel.
Desde a sua primeira aparição pública (real ou virtual) já passei por, pelo menos, três estágios relativamente à nova geração do Classe C da Mercedes. Quando surgiram as primeiras imagens oficiais, e quando o vi ao vivo pela primeira vez, em salão, pareceu-me um automóvel por demais distinto, que decididamente iria marcar a diferença também no plano estético. Depois veio a segunda fase, quando comecei a encarar as primeiras unidades do modelo a circular na via pública, e em que me pareceu menos deslumbrante, algo apagado até, face às expectativas inicialmente criadas. Hoje, sinto-me como que a meio caminho entre as duas situações: não sendo, de facto, tão imponente quanto parecia quando visto isoladamente, também me parece integrar-se na paisagem urbana com a elegância suficiente para que não seja pelo estilo que o seu sucesso será condicionado.
Talvez tudo isto se deva, por um lado, ao corte radical que a Mercedes estabeleceu com a anterior geração do Classe C, e, por outro, à nítida inspiração que o modelo foi beber ao novo Classe S. Inequívoco é que, com os elementos da opcional linha AMG, como acontecia com a unidade ensaiada, o novo Classe ganha outra pose – merecendo aqui referência o pormenor delicioso das “pestanas” em LEDs azuis das ópticas dianteiras, que se iluminam quando se abre remotamente o fecho central.
Do que não restam dúvidas é que este é não só o melhor Classe C de sempre, como um dos que mais evoluiu face ao modelo que o precedeu. Assente numa nova plataforma, é aqui analisado na versão que mais interessa ao mercado nacional por ora (a equipada com o motor 2.2 turbodiesel de 170 cv, no caso combinado com a opcional caixa automática de sete relações 7G-Tronic Plus), e não é preciso muito para perceber todo o progresso por si registado.
Mecanicamente, a alteração mais radical foi efectuada ao nível do châssis. Não tanto pelos elementos que o compõem, ou respectiva arquitectura, mas pela sua afinação, que confere ao novo Classe C uma postura e uma atitude francamente apelativas no plano dinâmico. Com suspensões multilink em ambos os eixos (aqui complementadas pelo opcional – mais um… – amortecimento pneumático Airmatic), e uma distância entre eixos incrementada 14 cm face ao seu predecessor (o comprimento total aumentou 32,5 cm, o que faz deste um dos maiores modelos do segmento), o novo C 200 BlueTEC é um verdadeiro primor em termos de comportamento.
À sua disposição, a par da boa postura ao volante, o condutor começa por ter o novo sistema Agility (finalmente em consonância com a concorrência), que oferece cinco modos elegíveis (Economy, Confort, Sport e Sport+, além de um configurável às preferências do utilizador, denominado Individual), assim fazendo variar a resposta do acelerador e da direcção. Como a unidade em teste dispunha ainda de mais dois opcionais – a direção Direct Steer Confort e a direcção Sports Direct Steer, esta última incluída na linha AMG -, sublinhe-se que a acção do sistema Agility se fazia sentir, neste caso, mais sobre o acelerador do que sobre a direcção.
Quanto à suspensão Airmatic (opção única neste segmento), as alterações entre os diversos modos eram mais notórias em termos de controlo de movimentos da carroçaria do que de conforto, o que não se estranha, tendo em conta que na linha AMG também estão incluídos a suspensão rebaixada 15 mm e as jantes de 18” com pneus de baixo perfil e diferentes dimensões nos dois eixos. Mas, ainda assim, há que reconhecer que é preciso a qualidade do piso degradar-se de forma dramática para que os ressaltos cheguem a incomodar efetivamente quem segue a bordo.
Em auto-estrada, o novo Classe C é, simplesmente, soberano em termos de comodidade e estabilidade, parecendo até imune aos ventos laterais. Ainda assim, é mesmo quando chegam as curvas que a verdadeira surpresa acontece, e até no modo mais macio da suspensão o modelo é muito eficaz, com reações sempre honestas e previsíveis. A consistência comunicativa da direcção bastante directa aumenta em consonância com a velocidade, do mesmo modo que ao aumento da firmeza do amortecimento corresponde uma atitude mais acutilante.
Rápido a curvar, com a traseira a acompanhar na perfeição o eixo dianteiro, mas sempre com uma segurança e facilidade de condução absolutamente notáveis (como é tão do agrado do típico cliente da Mercedes), quando todo o setup está orientado no sentido da máxima eficácia, o C 220 BlueTEC chega até a ser bastante divertido de conduzir nos traçados mais sinuosos e exigentes feitos mais “ao ataque”. E só não o posso considerar emocionante porque a marca da estrela insiste em não permitir a desativação total do controlo de estabilidade nas versões dos seus modelos que não sejam verdadeiramente radicais, assim se perdendo aquele extra de agilidade que, seguramente, este châssis teria para oferecer – o máximo que se consegue é desligar o controlo de tracção, e mesmo assim é preciso percorrer através dos botões do volante multifunções os diversos menus do sistema de bordo para o conseguir… Não obstante, não é demais afirmar que, na nova geração, o Classe está mais dinâmico e interactivo do que nunca!
Já o motor é um velho conhecido que sofreu algumas evoluções para ser capaz de cumprir já a norma Euro 6 de protecção ambiental, nomeadamente através da adição do AdBlue ao sistema de combustão – uma solução à base de 32,5% de ureia e 67,5% de água, destinada a reduzir drasticamente as emissões de óxidos de Azoto (NOx), e em que o acesso ao respectivo depósito, para reposição do nível, é feito através de um bocal existente junto ao do depósito de gasóleo, atrás da tradicional portinhola. Sempre disponível, este quatro cilindros de 2,2 litros não prima propriamente pelo silêncio de funcionamento, e os 170 cv que oferece dão para o que dão – adoptar ritmos muito interessantes em estrada aberta, depois de “embalado” o C 220 BlueTEC, mas sendo menos brilhante que a principal concorrência em termos de acelerações e recuperações.
Apesar de tudo, o progresso registado pela não menos conhecida caixa automática de sete relações (por isso agora designada 7G-Tronic Plus), ainda mais rápida na troca de mudanças, e com patilhas no volante para comando manual em sequência, permite disfarçar muito bem algum défice de potência sentido pelo C 220 BlueTec face, por exemplo, ao BMW 320d de 184 cv quando o nível de exigência aumenta. Os consumos, esses, não merecem reparos, bem pelo contrário, com médias em condições reais de utilização na casa dos 6,5 l/100 km a serem dignas de encómios – pena que a autonomia seja limitada por um depósito com apenas 41 litros, isto é, menos 19 litros do que na anterior geração.
Mas a experiência de condução do novo Classe C não se esgota na excelência da dinâmica – bem pelo contrário. O interior passa a ser a verdadeira referência da sua categoria, pela qualidade (percepcionada como real!) dos materiais, dos acabamentos, do cuidado posto em todos os pormenores, sublinhada na unidade ensaiada pelo revestimento em pele do habitáculo, que se estendia, inclusivamente, ao tablier. Para a qualidade de vida a bordo contribui ainda, decisivamente, a óptima insonorização, que faz praticamente passar despercebida o desempenho medíocre do motor neste particular.
Também o design e a decoração interiores são do mais apelativo da classe (e da própria gama da Mercedes) do momento, ou não se tivesse, também aqui, o Classe C inspirado no topo de gama da casa de Estugarda. Funcional, elegante e exibindo um inegável bom gosto na combinação de elementos digitais e analógicos, prima pela riqueza dos pormenores decorativos, como sejam as saídas de ventilação ou as aplicações em alumínio nos botões de comando dos vidros eléctricos.
Claro que a tecnologia também marca aqui presença de destaque. Mesmo que a sua integração possa não ser tão bem conseguida como em alguns concorrentes, o enorme ecrã instalado ao centro do tablier (que mais parece um tablet de dimensões generosas, mas não táctil – felizmente…) garante uma visibilidade e legibilidade irrepreensíveis, sendo as funções do sistema de infoentretenimento controladas através, ou de um anel rotativo e de um touch pad colocados junto ao apoio central de braços, ou do volante multifunções. E para que os pouco adeptos destas novas tecnologias não se sintam menos à vontade, existe uma grande redundância para controlo das principais funções do veículo: vários botões de atalho para acesso directo, uns colocados na consola central, abaixo dos comandos da climatização (sistema de navegação, rádio, fontes multimédia e telefone), outros junto ao comando das luzes (direção Direct Steer, assistente à manutenção na faixa de rodagem, inibição dos sensores de estacionamento e cruise-control activo).
Duas notas dissonantes: a organização dos menus do ecrã instalado no painel de instrumentos (com uma excelente legibilidade, refira-se) passou, sem dúvida, a ser mais complexa e menos directa e intuitiva do que anteriormente; a colocação do touch pad sobre o anel rotativo faz com que, por vezes, se seleccione involuntariamente uma função não pretendida, dado que o movimento natural da mão para operar o segundo seja apoiar a respectiva palma sobre o primeiro, não sendo raro que a pressão da mesma o acione quando o não pretendemos.
No que à habitabilidade diz respeito, e não obstante o aumento do comprimento exterior e da distância entre eixos, o novo Classe C desilude um pouco, por não se conseguir equiparar à concorrência no espaço que disponibiliza a quem viaja atrás, sobretudo em altura e para as pernas. Já a mala, com 480 litros de capacidade, é das mais amplas desta classe, e ainda garante um fácil acesso, graças a um plano de carga baixo e bastante amplo. Sob o piso existe um espaço para arrumação de objectos e inclusive uma caixa desmontável em plástico (mais um item da lista de opções, em conjunto com a rede da bagageira e o duplo porta-copos desmontável instalado na consola central).
Sem dúvida a nova referência de um dos mais exigentes e disputados segmentos do mercado, o novo Mercedes Classe C não deixa contudo de ser um automóvel com o qual o convívio (ou a qualidade deste) muito depende de uma lista de opcionais praticamente interminável, o que tende a fazer variar substancialmente o seu preço em função das exigências de cada qual. A par de tudo o que já foi referido anteriormente, e do descrito em detalhe na nossa ficha de equipamento, deixo aqui outros dos elementos mais marcante s, como o head-up display, o enorme tecto de abrir panorâmico, o excelente sistema de som Burmester ou os óptimos bancos desportivos dianteiros, parcialmente reguláveis electricamente. Mais uma vez provando a velha máxima de que a qualidade e a sofisticação têm um preço… Mas que é o Classe C que mais gostei de conduzir até hoje, lá isso é!
por ANTÓNIO DE SOUSA PEREIRA